A Medida Provisória (MP) 1.303 do governo federal, que visa tributar títulos de renda fixa atualmente isentos de Imposto de Renda, reacendeu o debate no mercado financeiro brasileiro. Enquanto a maioria dos agentes se opõe à proposta, o ex-diretor do Banco Central (BC) e sócio da Panamby, Reinaldo Le Grazie, manifestou-se a favor da taxação, argumentando que a isenção fiscal causa distorções e prejudica a alocação de capital na economia.
Impacto da Isenção de Renda Fixa
O benefício fiscal concedido a títulos específicos, como Letras de Crédito Imobiliário (LCIs), Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) e debêntures incentivadas, era inicialmente de baixo impacto. Contudo, Le Grazie pontua que o cenário mudou.
“Quando começou a dar incentivo para esses setores, lá no começo do século 21, era tão pouco. Coisa de R$ 50 bi, o governo dizia ‘não se preocupa, não’. Agora é R$ 1 tri e tanto, grande demais para mexer”, afirmou o ex-diretor do BC em entrevista ao Seu Dinheiro, durante o evento Onde Investir no Segundo Semestre.
Para Le Grazie, a existência desses títulos isentos de Imposto de Renda “atrapalha tudo” e desestimula a análise aprofundada de risco e retorno. Ele enfatiza que investidores, mesmo cientes de alternativas mais rentáveis, optam pelos isentos apenas pelo benefício fiscal.
“Ninguém gosta de pagar Imposto de Renda. Clientes, que fazem conta ou não, perdem dinheiro aplicando em isentos. Existe uma alternativa melhor de rentabilidade, ele sabe, mas fala ‘não quero pagar imposto’, e compra o isento”, disse.
De acordo com a MP 1.303, títulos como LCI, LCA, CRI, CRA e debêntures incentivadas passariam a ter uma tributação de cerca de 5%. Outros investimentos mais recentes, como a Letra Imobiliária Garantida (LIG), também seriam incluídos, mesmo que a intenção inicial de Le Grazie, co-criador da LIG, fosse que não fosse um título isento.
Distrações no Mercado e Fundos
Uma das maiores distorções apontadas pelo ex-BC é a comparação entre os títulos isentos e outros produtos financeiros, como os fundos de investimento. Ele destaca a dificuldade em explicar a complexidade tributária de fundos com come-cotas e justificar sua superioridade perante os títulos isentos. Com a proliferação de fundos isentos, como os fundos de infraestrutura, Le Grazie prevê o desaparecimento gradual de produtos tributados.
Le Grazie critica o incentivo para pessoas físicas investirem em produtos que podem não ser adequados aos seus perfis de risco, citando títulos de infraestrutura com vencimentos longos, de 10 a 15 anos. Essa demanda por títulos isentos, que a indústria celebra como sucesso, desloca o preço e afasta investidores institucionais, como fundos de pensão, que idealmente deveriam investir em longo prazo na infraestrutura.
“A pessoa física comprou R$ 55 bilhões de títulos incentivados e a gente diz que essa indústria é um sucesso. E o fundo de pensão, que precisa investir a longo prazo, não investe mais em infraestrutura, porque o preço ficou deslocado por causa da isenção”, afirmou.
Visão Otimista sobre a MP 1.303
Apesar de ser um aumento na carga tributária, o ex-diretor do BC avalia a MP 1.303 como um passo “bem razoável” e na direção correta para a economia brasileira. Para ele, o ideal é aprimorar o texto e avaliar as medidas com foco no longo prazo, visando uma alocação de capital mais eficiente no país.
“Muitos amigos discordam, mas eu gostei da MP”, disse Le Grazie no evento.